segunda-feira, 26 de abril de 2010

Cárcere (PARTE I)

16 de Outubro de 1791

Aqui estou eu, escrevendo meu primeiro diário. Eu Severino da Cruz, escrevendo do calabouço do prédio da Justiça, preso por ter roubado comida, porque eu não tenho condições de viver, ninguém me emprega. Como eu vou poder me sustentar se não for roubando, e que mundo é este que zomba de mim só porque sou pobre? Por que ficam me olhando na rua como se eu fosse um louco, um assassino? Mas não, só o que eles não entendem é que eu apenas procuro sobreviver e o meu modo de sobrevivência é diferente do deles, mas apenas no modo, por que eu roubo comida e eles roubam nos impostos.

Talvez seja até melhor, aqui eu não pago imposto, tenho onde dormir, apesar de ser amedrontante a qualquer hora do dia. Aqui não existe dia, é sempre noite nestas celas solitárias, escuras, úmidas, infestadas de ratos que, às vezes, passeiam pela minha sela brigando por um pedaço de carne seca. Não sei se vou ter que me acostumar com isto, porque o que eu não comentei é o que eu acho inevitável, eles vão me julgar ainda, e eu sei que se eu me livrar da acusação, eles me tiram daqui, mas se eu for culpado, eu vou para a forca, e já estou sem esperanças, que se alguém vem para cá, já esta a meio passo de la, pois ninguém jamais saiu daqui vivo.

Eu posso até ver da minha janela, é assim que eu chamo um buraco na parede por onde entra um pouco de luz, estão construindo a minha forca que é uma das centenas que já construíram. Já fizeram tantas que já está virando obra de arte, e quando fico muito angustiado em ver as primeiras madeiras da minha morte, eu fico apenas ouvindo o barulho que eles fazem e que entram perfurando meus ouvidos, já muito castigados, ouço que eles não batem por todo o dia, só pela tarde e terminam quando o sol começa a dormir, por isso sei que vai demorar um pouco, mas, mesmo assim, toda vez que ouço algum barulho no calabouço, penso que é para me levar para passear engravatado pela madeira.

Lembro-me que quando eu cheguei, um encarcerado estava sendo levado para ser fuzilado no grande muro, e eu só fiquei ouvindo seus gritos de agonia sabendo seu destino e depois só o que ouvi foi aquele terrível trovão.

.

.

.

-CONTINUA-

Nenhum comentário: